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“Trazia o Bilhete de Identidade na algibeira de trás. Deve
ter caído… o que vale, é que toda a gente sabe o meu nome”
Eram três. Todos com o mesmo nome: Fernando. Aconteceu na
passada quarta-feira, dia 22, na antiga livraria Buchholz, na Rua Duque de
Palmela, em Lisboa. Fernando Dacosta, Fernando Arrobas da Silva e Fernando
Tordo. Um escritor e ex-jornalista [conforme fez questão de esclarecer], um
advogado e um compositor/poeta reuniram-se para falar. De quê? Das suas
identidades, sem dúvida. Quando se fala do que se sente, do que se pensa, do
que se vive[u], será impossível não revelarmos a nossa identidade. Três homens,
ao longo de quase hora e meia, contaram histórias, reavivaram memórias,
arrepiaram sentires.
O moderador João Morales lançou o mote perguntando onde
estava, cada um deles, quando Fernando Tordo venceu o Festival da Canção, em
1973, com “A Tourada”, uma das muitas co-autorias com José Carlos Ary dos
Santos. Foi o caminho para se falar da censura, de como a contornar, do que era
o jornalismo antes do 25 de Abril, de como era obrigatório estar perante as
câmaras da RTP.
Fernando Dacosta alagou-nos com as suas vivências e
convivências com grandes vultos da literatura e do jornalismo como José Cardoso
Pires, Baptista-Bastos, José Saramago, Raul Rego, Natália Correia.
Transmitiu-nos o seu olhar sobre o País actual, sobre a recusa de muitas
cabeças com elevado responsabilidade nacional em aceitar que Portugal é um País
com muitos séculos de História e com as mais antigas fronteiras no espaço
europeu. Fez passar uma mensagem de esperança, crente num povo que tendo sabido
ultrapassar inúmeras situações de crise, conseguirá seguramente superar o
momento actual que apelidou de ‘pastoso’.
Fernando Arrobas da Silva, recorrendo à sua especialidade,
tentou justificar porque o poder judicial passa incólume às mudanças de regime
e de ideologias políticas. Mas também contou histórias. Daquelas que estão nos
bastidores do que chega à imprensa e conhecimento público. Cativou com
pormenores policiais, de direito, mas também de humor. Nas suas próprias
palavras, contou-nos uma novela baseada em factos reais e que terão justificado
a sua passagem pela SIC, como convidado permanente do programa “Casos de
Polícia”.
Fernando Tordo tem, quanto a mim, o poder de encantar e
emocionar quando conta as suas ‘histórias’ e levou-nos a recordações dos tempos
em que começou a trabalhar com Ary dos Santos, quando há quarenta anos atrás
terá ido um dia, ali perto da Duque de Palmela, para ensaiar o “Cavalo à Solta”.
Revelou-nos o fascínio sentido pelo poeta quando, ao fornecer-lhe a
terminologia das corridas tauromáquicas, Ary dos Santos soube que havia uma
figura intitulada de ‘inteligente’. Nas palavras do compositor, o poema terá
corrido tal era a vontade de poder ‘brincar’ com o ‘inteligente’. Fernando
Tordo põe a vida no que escreve, no que compõe, no que canta, no que conta.
Fala de si sem cuidados. Expõe-se. É quase impossível não nos sentirmos tocados
pela comoção perante episódios tão simples, mas tão magnânimes, quanto o que
narrou sobre um telefonema da sua filha em que lhe transmitia, nesse dia, ter
sido identificada com o seu irmão, João Tordo. A felicidade do pai ao
embevecer-se com o prestigio que o seu filho vem alcançando.
E foi a cantar os seus filhos que Fernando Tordo encerrou
esta tertúlia em que todos os que tivemos o privilégio de estar presentes,
encontrámos um pedaço dos Bilhetes de Identidade destes três Fernandos. Como se
estivéssemos num encontro de amigos, repartindo cumplicidades.
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