quarta-feira, 30 de março de 2011

Sinete


Pelo trilho dos luares
encontrei o eco das folhas
esvoaçando em dorsos de árvores,
a tua ausência escrevia-se na noite
e o vento esboçava gestos recusados,
insuspeitadas estradas soluçavam vigílias
no litoral duma página perfumada com um abraço
onde gravei teu nome em contornos da tua silhueta…

segunda-feira, 28 de março de 2011

Será?...


Será o horizonte aquele futuro,
morada dos sonhos,
e os dias de permeio
a distância percorrida, lado a lado,
por nossos olhares
sem questionar a certeza
de que só um único caminho
nos fará chegar?

domingo, 27 de março de 2011

Babel [words] *

imagem recolhida aqui


As paredes erguem-se em torres escritas por sombras. Raças distintas povoam o mapa do palco caotizando a expressão em diferentes línguas. A percussão uniformiza os gestos, ensurdece as palavras que divergem. Delimitam-se barreiras imaginárias, fronteiras de identidades a preservar. Estruturas metálicas suportam vidros invisíveis, confins de movimentos gritados. Movem-se, mudam de centro, derrubam-se, levantam-se, concêntricas transformam-se em torre, monumento indevido. A comunicação corporal ensaia uníssonos controlados, mecanicamente dirigidos. A razão conduzindo o movimento-emoção. Limita-se a geografia dos pensamentos, das reacções, das análises. Criam-se territórios para a privacidade, refúgios para o eu. Sobrevive-se numa luta generalizada, em câmara lenta cega-se na defesa do individualismo, da crença, da comunidade. Isolando-se, trancando as portas já fechadas. São diversas as torres enraizadas, crescendo em direcção a um cume desconhecido, tido como o supremo, o sublime. Quem sabe se desconhecendo que no extremo mais ermo será, porventura, possível olhar para o solo e perceber que existem caminhos partilhados, fés comuns, destinos únicos que os prendem como movimento unido, na necessidade de compreensão, no abandono pela sobrevivência, na busca pelo entendimento… e quando as palavras faltarem, recorrer-se-á à pele que se toca e explica o que a verbalização não compreende.

* Babel de Sidi Larbie Cherkaoui e Damien Jalet [no CCB]

sábado, 26 de março de 2011

Não nos pertencemos...


Pertencemos a dias diferentes
de meses que se cruzam
mais desejosos do que desejados.
... talvez nunca cheguemos ao tempo
correndo sem limite
nas margens de memórias
que nos lembrarão
como hora de rumo único…

quinta-feira, 24 de março de 2011

Cinza *


Cinza
sombra da cor,
reflexo da luz onde a alegria se esconde.

Cinza
superfície vazia,
eco de silêncio onde a vida se esbate.

Cinza
resíduos extintos,
marcha de despedida onde o adeus se senta
e a dor se levanta.




* a partir da imagem esquecimento, de sonja valentina

terça-feira, 22 de março de 2011

Ornamento


Derramaste um sorriso sob o lençol,
uma renda de felicidade bordou-se
na dobra persuasiva do dia,
deitei sobre o leito um olhar,
sonho em espiral de quem procura,
no rodopio das horas sem tempo,
o linho das memórias adormecidas.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Poema [a todos os artífices da palavra]


Como o Deus
incapaz de guardar seus sentimentos,
o poema nasce
em excertos de oração,
prece espalhada pelo mar
espelho de estrelas,
asas em cadência libertam sílabas
descobertas por anjos de alma amordaçada
e como religião
depara-se diante de olhares crentes
a divina expressão do etéreo.


21.Março.2011   .   Dia Mundial da Poesia

domingo, 20 de março de 2011

Soberano


Deixa-me ser soberano supremo
desse teu reino de estações,
para ter a certeza dos ciclos
e saber que a cada partida
suceder-se-á uma nova chegada.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Luz das palavras


As palavras morrem alongadas
no adivinhar que as velas iluminaram.
Nas margens duma página branca
espero a resposta silenciada
pelos corpos derramados em sombras
nas paredes alva onde novo dia se inicia.
Engulo a luz das palavras caladas
enquanto a madrugada espessa flui
em grãos extintos duma noite esvaziada.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Extravasamento

© Caminheiro

Na espuma senti a sede
tocar-me o deserto em que me espraio,
bebi em sal o teu desejo
enquanto me abri em poros
para que me penetrasses
em humidade e volúpia molhada,
ofereceste-te em derrame,
convite para me tornar istmo
estrangulando-me na tua imensidão.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Círculo recto


Nas linhas rectilíneas do horizonte
esboçam-se contornos dóceis do teu corpo,
como se as minhas mãos fossem forma
golpeando a seriedade da perspectiva.
Boleia-se o olhar no rascunho do sonho
e o meu desejo fecha-se em moldura
dum espelho segredo onde te moldas
em linha recta para o centro de mim.

sábado, 12 de março de 2011

Voo perdido


Ofereci-me em vagas
para saciar o nomadismo dos teus voos.
moldei minhas marés
ao ciclo das tuas luas.
voei
sempre que as tuas asas foram meu abrigo.
sorri
quando a tua luz em mim se reflectia.
mas não és ave para um único mar
e toda a minha água é ínfima
para te servir de ninho.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Passos


Sentidos são os passos
que em memória percorro
no chão que me abriste.
Sentidas são as memórias
de passos que percorri
para chegar ao teu chão.
No chão deixo as memórias
que abro quando meus passos
não se encontram nos teus…


terça-feira, 8 de março de 2011

Tejo em mim

© cm

Sonho-te Tejo
a correr dentro de mim,
quando o teu abraço tarda
no sol erguendo-se a nascente,
preciso do vento desse amor
soprando velas de dias mareantes,
quero sentir o casco das caravelas
sulcando o leito de inumeráveis memórias…
desejo-te Tejo
transbordando-te nas minhas margens
despenhando-te em foz
ancorada, a poente, no meu peito.

domingo, 6 de março de 2011

Teu olhar


Procuro o teu olhar…

é esse cruzamento que,
segurando-me à terra,
me dá a mão para voar.

Porém,
o que mais desejo
é encontrar o teu olhar
preso nesse horizonte
seara onde os meus sonhos
se semeiam.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Rastos de estrelas



Esperam da lua,
o sinal da noite,
as estrelas mergulhadas
em segredos de mar,
incólumes irão subir
a um céu cadente
e os seus cabelos sargaços
serão rasto na rota
da imensidão onde meu olhar
se perde…

quarta-feira, 2 de março de 2011

Nocturna Palavra


Nocturna é a palavra
que no meu corpo arde
sobre pétalas preteridas
pelo vento que te afasta,
queimo-me no reflexo da tua imagem
em que a tarde te despiu
e os sonhos se vestiram de desejo
para se escreverem no meu sono.

Cálculos


nunca poderão ser 'um', todos os dois para quem dividir não signifique multiplicar!

terça-feira, 1 de março de 2011

Por um... *


Procuro
na reminiscência dum olhar
a tradução do sentimento,
emaranhado de caracteres por explicar,
na ilegibilidade do dizer
decifro sinais de incerteza,
símbolos impressos de timidez
na teoria lúgubre dum desejo
e por esclarecer ficarão,
na sepultura duma sombra,
as certezas
gravadas no mármore duma lápide
por um amor que não viveu.


* a partir da imagem [sem palavras], de sonja valentina