domingo, 14 de novembro de 2010

Ilha



Corria, numa subida vertiginosa, ao cume da duna mais alta da ilha. Sentava-se na expectativa de avistar o mastro e as velas desfraldadas sopradas pelo vento da vontade. O coração batia-lhe mais depressa, talvez pelo ritmo da subida, mas também pela ansiedade do momento esperado. Depois voava, numa descida desmedida, pontapeando areia, levantando um tufão de felicidade. Não ficavam pegadas do seu caminho, pois quase não pousava os pés para chegar até à beira-mar, onde tudo se consumava. Quis os dias assim, repetidos, preenchidos, infinitos, eternos.

Mas… nem sempre as marés são cheias. Há dias em que as ondas não chegam à praia. E surgiram os dias em que o sonho não saiu das suas fronteiras. E nesses dias as descidas tornaram-se pesarosas. Sulcos densos fundearam-se como se pretendessem abanar o alicerce da duna. Um vento começou a soprar e a dificultar as subidas. Para que elas não se tornassem penosas, começou a olhar em volta, a apreciar pormenores em redor. O seu coração esperava. Mas quando o mastro arrastava o branco das velas até ao seu horizonte, sentia um sorriso rasgar-se no peito e a esperança voltava a ser o acordar do amanhã.

As marés-cheias começaram a espaçar-se. A água demorava cada vez mais a tocar-lhe nos pés, a apagar as pegadas que no dia seguinte tinha a certeza de novo cunhar. Deixou de se sentar no cume da duna. Subia, olhava e descia, passava pela praia e escrevia o seu vestígio. Ocasionalmente regressava para perceber se fora deixado algum sinal. Os dias distanciaram-se em desencontros sucessivamente mais frequentes. O coração parecia bater mais lentamente, arrastando um ritmo sobrevivente, restavam marcas de gotas no areal cada vez mais vazio de sinais de pés. Distanciaram-se os rumos e as cinzas do que ardera espalharam-se, com o vento, dispersas como sementes de histórias incógnitas que pareciam nunca se terem tocado.

O fascínio do encontro-surpresa ficou esquecido num vale cavado pela distância. No seu caderno de confidências escreveu: ‘Preciso que me enchas o copo para te beber! Preciso que te faças sede para não me secar!’

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