sábado, 27 de fevereiro de 2010

O Mensageiro


Poderá a morte ser uma notícia que se oferece num prato frio e insensível? Haverá preparação psicológica que contorne a revisita ao que se viveu lado a lado? É possível passar incólume à dor que involuntariamente se provoca, quase como se fosse, não o mero comunicador, mas o próprio assassino? Como cumprir princípios escritos com base na razão, mas que não viram na pele as valas onde a guerra enterra esperança, confiança, felicidade? Até quando pode o mensageiro resistir à necessidade de confortar aqueles que ‘agrediu’ com a notificação menos desejada?

O Mensageiro, de Oren Moverman, apresenta-nos a realidade da guerra por uma janela menos vezes aberta. Revela-nos a dor de quem é incumbido de levar às famílias a notícia da morte dum familiar, em combate. Mostra-nos o sofrimento de quem é confrontado com as mais díspares reacções, os mais inesperados ambientes. Ao sargento Will Montgomery é pedido que não reaja, que se limite a informar. É-lhe exigido, pela frieza e insensibilidade militar, que não lembre as feridas trazidas na pele, que não deixe sarar as memórias que ainda sangram.

Como pode alguém que não viveu, ensinar a viver? Só quem sente, reunirá condições para reger a emoção. Só quem experienciou a guerra poderá adivinhar a linguagem da morte, por ela provocada. A nós, os que temos a fortuna de nunca a ter vivido, restar-nos-á desejar continuar a sermos simples espectadores de histórias como esta, cuja continuação se adivinha para além duma porta, onde se partilhará a cicatrização das chagas sulcadas pela guerra que insiste traçar, a muitos, imprevistos rumos para a vida.


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