quinta-feira, 17 de junho de 2010

Seara, sol... tempestade em mim


Poder-te-ia ter sonhado seara alastrando o espectro na indefinição do meu tempo. Em cada manhã poderia ser sol nascendo na tua mão esquerda. Abririas cada espiga, de peito aberto, em direcção ao céu que eu cruzava ao encontro dum voo que acompanharia o teu sonho rasgando-se a sul. Em ti, a sede abriria sulcos no solo de que faria meu chão e onde correria qual ribeiro desbravando cada margem do teu segredo. No final da tarde desceria sobre o teu ombro direito, lentamente, oferecendo-te a chegada da noite e dormiria em ti, num sigilo só nosso, enquanto o mundo julgar-me-ia a contornar continentes. Mas, na realidade, apenas és vento que passas impetuosa pelos meus galhos. Tento-me segurar no tronco com uma vontade de me deixar ir nos teus sopros. Levas de mim folhas e seiva que espalhas pela areia dos dias. E fico à espera que chegues feita brisa. E agrupes cada pedaço de mim no reencontro que procuro. E cada vez que passas ficam em balanço as portadas do meu coração que te abro para que entres e não deixes que se fechem no silêncio do recato. Poder-te-ia ter sonhado serenidade estival, mas desejo-te tempestade perpétua fazendo do meu deserto, arrozal inundado pelas sementes do teu querer que verdecem as palmas da mão que abro, em esperança, para amanhã.

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