quarta-feira, 3 de março de 2010

Junto ao rio

© cm

A noite desceu a ladeira que nos encaminha. Só a corrente das águas restolha sobre o silêncio que as nossas palavras profanam. Mergulham no rio, os degraus que elegemos como pouso. Seguramos nas mãos o tempo em fuga, sem prazo, para uma foz que não demora. Um rosto sem luz própria espelha-se na tona inquieta duma torrente conduzida pelo vento e por uma vida acrescentada. O teu olhar adivinha uma face onde o meu só vislumbra vultos de continentes. Acendem-se fogos em minúsculas cristas erguidas pela irreverência. Ditas-me sonhos a que roubo palavras. Guardo-as, impedindo-as de fugir para o mar. Serão cânticos de memórias daquela noite em que os canaviais se esconderam para nos ouvir segredar. Os corações sentam-se frente a frente quando fazes do meu colo o teu trono. Reinas em mim sem eleição. É uma necessidade da alma que te torna soberana dum sentimento que as indiscrições mal conseguem identificar. Fecha-se na quimera, este desejo de reter na palma da mão, um sopro beijado nos lábios…

2 comentários:

Anónimo disse...

"Os corações sentam-se frente a frente quando fazes do meu colo o teu trono." Olha outra frase "daquelas"!
Eu gosto bastante da tua poesia, mas, como sou mais de prosas, estes textos encantam-me ainda mais.

Milhita disse...

A manhã ficou mais bonita... Tinha saudades de ler prosa cantada, um bailado de palavras e os passos, as pegadas que deixas nos textos.
Que bom reencontrar.
Vou marcar um lugar, e ficar.
Um abraço!!!